quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

"Ressonâncias", exposição de Desenho, Festival Interferências - Lisboa 2012



Fotografia . André Cunha e Silva

A Singularidade do Múltiplo é um evento que decorre no âmbito do Interferências – Mostra Pública de Arte, organizado pela Associação Número Arte e Cultura em parceria com o Espaços do Desenho e desenvolvido em co-produção e residência artística com o Centro Português de Serigrafia, a Galeria Corrente d’Arte e o Metropolitano de Lisboa.


artistas convidados: Martinha Maia, Marta Wengorovius, Sara Yan, Susana Gaudêncio, Carlos Farinha e João Pedro Silva
Comissária: Teresa Carneiro

Mostra de trabalhos nas carrugens do Metropolitano de Lisboa











 
 
Mostra de intervenções em ‘lugares perdidos’ nas estações do Metropolitano de Lisboa
Estação de Metro dos ANJOS (átrio norte)















Texto Crítico de Maria do Carmo Serén


Interferências


Se quisermos encontrar um ponto comum, (esses traços pessoais que fazem um complexo ou um estilo) na instalação daquele rio de papel de seda, nos Anjos, as séries de desenhos das “Interferências” ou, se formos mais longe, as esculturas de vidro semeadas por João Pedro Silva em terreno vivo, torna-se claro que o padrão director é a expressão de uma tensão minuciosamente imprimida à matéria.
Trata-se, evidentemente, de experimentações muito contemporâneas, num conceito de fazer agir, agindo, desarticulando olhares, deslocando.
O rio de papel azul forte, pontuado de roxo nos momentos de turbilhão maior , irrompe a partir de uma fonte ocultada, corre sob uma rectângulo estreito de compressão para nós, ameaçando galgar a janela que o suporta; o vidro força-lhe a direcção e navega, livre, para lá dos espelhos mais reais que o mundo de Alice.  Pequenas ondas picadas, trabalho laborioso no papel ingrato, lembram o movimento caótico das águas quando envolvendo obstáculos: repetem-se, invertidas nos espelhos, arrastando consigo os labirintos de um existir simulado.

Interferências são círculos negros concentracionários, metafórico Sol Invictus louvado a 25 de Dezembro: fonte de atracção e repulsa, gera e repudia exércitos metálicos, vermes serpentiformes, o céu azul de todos os horizontes ou as formas que a racionalidade sabe traçar em afã de subordinação. O Sol negro absorve e expele, respira toda a matéria do mundo. O processo decorre na nossa frente,  os efeitos são cicatrizes na nossa observação e nas serigrafias.
Apesar das mudanças de registo, das variantes sempre apaziguadoras – o círculo, o rectângulo, o fragmento de recta – o caos enquadrado das inscrições, tudo se abre numa violência armadilhada. E é essa violência subliminar, segregada pelo círculo, que lhe retira a natural dinâmica de círculo. Ele é o ponto fixo criador do turbilhão da destruição e do nada. O que poderia ser, em qualquer caso, uma metáfora da artificialidade da técnica e do duplo.

Maria do Carmo Serén, 16 Março, 2012



Fotografia . André Cunha e Silva